domingo, 17 de abril de 2011

A Inveja, O Ciúme e... o outro.

Diariamente (ou quase diariamente) somos confrontados com notícias de crimes passionais, casos de violência doméstica e/ou violência de namoro. Não vou, de todo, focar-me em nenhum caso específico de agressão, nem proceder a qualquer elaboração de perfil psicológico de vítimas/agressores. Vou, sim, esmiuçar o que se encontra mais intrínseco e entranhado em todos estas situações: a Inveja, o Ciúme e… o outro.

A Inveja pode ser encarada como um sentimento muito primário, arcaico, vivido numa relação binária (a dois). Em termos simplistas, é querer algo que o Outro tem, implicando, igualmente, a destruição daquilo que me falta (incompletude narcísica) – "Eu quero aquilo, quero para mim e quero destruir o Outro". Exemplo prático: “Eu quero O carro que o João tem, quero muito aquele carro ou então que o João tenha um acidente e que parta o carro todo, assim já mais ninguém o tem.” 

É relevante não confundir o conceito de «inveja» com o de «cobiça». A inveja implica a destruição, aniquilação daquela parte da pessoa que Eu não consigo ter, enquanto na cobiça ambiciona-se algo igual ao que o Outro possui mas que não é exactamente o mesmo – “Eu tenho inveja dO carro dO João. Eu cobiço o carro que o João tem, gostava de ter outro igual”. 

No que remete para o Ciúme, tal como refere Melanie Klein, este é um avanço, em termos mentais, extraordinário: envolve a complexidade da mente. Enquanto a inveja envolve partes de pessoas, partir a parte que se quer destruir do objecto, no ciúme envolve a pessoa na sua totalidade, envolve uma triangularidade – desejo de vinculação – e um medo de perder o objecto de amor. Assim, a pessoa combate pela posse total e exclusiva do Outro, sabendo previamente que isso não é possível, pela consciência da existência de um terceiro elemento. Enquanto a inveja é dominada por um sentimento de falta e um desejo de apoderar-se, no ciúme está em causa um sentimento de perda ou ameaça de perda e um desejo de retenção. Num e noutro caso, o amor-próprio é altamente atingido – na inveja sob a forma de ressentimento, no ciúme sob a forma de humilhação.

Depois da Inveja e do Ciúme, é a vez do outro… A Gratidão.

A gratidão pode ser encarada como o pólo oposto da inveja. É, assim, o sentimento que possibilita alcance o lado Bom do Outro – a base das relações amorosas – e avaliar o que há de Bom em nós próprios. Aquele que sente gratidão pelo Outro, reconhece nesse mesmo Outro uma presença que se ausenta em si (o Outro tem algo que lhe falta). Podem pensar que este reconhecimento, esta consciência da minha falta inscrita no outro provocará qualquer tipo de sentimento depressivo no meu Eu. Pelo contrário. O esperado é o reconhecimento dessas mesmas faltas do meu Eu no Outro e tentar apoderá-las, não de uma forma destrutiva como é padrão do invejoso, mas sim como um processo normativo de troca nas relações.
Assim, os sujeitos invejosos, dominados por um Eu em desarmonia e enfraquecido, são «impostos» a procurar novos objectos de amor, uma vez que nenhum deles consegue satisfazer as suas necessidades (as faltas narcísicas) e as suas expectativas.

Em suma, deixo aqui uma fórmula do psiquismo criada por mim como forma de integração da informação exposta.


Explicação (tentando ser simples) - A dualidade integradora Amor(A)-Ódio(O) domina a instância do nosso ego (E). São os nossos dois pólos. Amor/Ódio, Prazer/Realidade, Vida/Morte. Associado ao artigo em questão, passamos para o ponto II. O Ciúme (C) é o denominador da instância maior Amor, uma vez que, como explicado no artigo, os ciumentos têm uma necessidade extrema pela procura de vinculação, com medo de perda de amor objectal. Assim como o Ciúme está para o Amor, a Inveja (I) está para o Ódio (O), com todas as pulsões agressivas características dos sujeitos invejoso - a destruição do objecto parcial ambicionado. Se ficássemos apenas com estes dois pólos, teríamos uma estrutura psíquica deficitária. Ao juntarmos G (Gratidão), juntamos a capacidade de projectarmos as nossas faltas, inseguranças e medos no Outro, onde construiremos, se tudo correr normativamente, uma relação empática com o Outro. Quando este terceiro passo se completa, estamos perante um psiquismo (Símbolo Psi), minimamente organizativo.


quarta-feira, 6 de abril de 2011

Morro sem ti... Vivo sem mim...

Dei por mim a pensar na morte e no significado que ela tem para a nossa vida e mais… a forma como a incorporamos banalmente no nosso sentido. E pensando na morte questionei-me sobre o real sentido de estar a «morrer» sem algo ou sem alguém.

Qual o significado-real da afirmação “Morro sem ti”? «Morrer» sem o Outro, ainda que na esfera simbólica, traduz a presença de um vazio interno esbatido na falta do Outro e um preenchimento do próprio imago quando o Outro se inscreve na nossa essência. Traduzindo… ao assumir a nossa morte sem o Outro, estamos a perpetuar a nossa própria morte como identidade própria uma vez que, nesse caso, encontramo-nos numa relação fusional com alguém onde as identidades se cruzam e se fundam. Se o Outro está, sou completo. Se o Outro não está, sou nada.

Todavia, “Estou a morrer sem ti” é, invariavelmente, uma proposição paradoxal, uma vez que na ausência do Outro a presença da Morte é uma constante-real no âmago da vida. A vida apenas subsiste inscrita no significado da morte onde na ausência da presença desse significado, o signo da vida carece da espontaneidade e da vivacidade que realmente lhe é característico.

Digo, a vida só ganha sentido se esse mesmo sentido tiver consciência da presença da morte, sendo que a morte só nos ganha significado se a vida que levamos tiver para nós um mesmo significado. Já alguém dizia "Vive como se fosse o último dia, pois um dia será mesmo o último."

Concluindo… Não se morre na ausência do Outro, vive-se, sim, com o pesar da nossa falta na ausência do Outro.