segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O Despertar da Bela Adormecida: Notas sobre a Adolescência (I)


Neste post, à semelhança do que foi feito no Quem tem medo do lobo mau? , irei proceder a uma análise de um conto de fadas tradicional, A Bela Adormecida, e transportá-lo para os tempos actuais, interligando-o com uma etapa fulcral do desenvolvimento humano -  
A Adolescência.

O  que é isso da Adolescência? 

A adolescência é, essencialmente, um trabalho de luto. Luto pelo corpo infantil, pela passagem ao corpo adulto, luto pelas relações parentais. A adolescência é o período em que a pessoa começa a ter de tomar decisões de uma forma autónoma (com quem me dou, para onde vou, o que vou fazer, até que horas, etc.). E é à chegada a este ponto de autonomia que ocorre o rasgo das ligações para com as figuras parentais. Daí dizer-se que no período da adolescência estamos perante dois lutos. O primeiro, pelo corpo infantil, onde o adolescente vai abandonando os seus traços corporais da infância e, mergulhando num vasto oceano hormonal, vê o seu corpo a ir mudando em direcção ao climax da adultez; por outro lado, ocorre esse luto para com as futuras parentais, onde o adolescente vai, saudavelmente, marcando a sua posição de auto-suficiência, independência e maturidade.  Todavia, todo este processo coloca em nu integridade psicológica do adolescente, sendo, por isso, a fase do desenvolvimento onde o maior número de perturbações são instaladas, já que o suporte familiar começa a ser, e muito bem!, quebrado.

No período da vida de uma pessoa, podemos destacar dois que são essenciais. Em primeiro lugar, falamos da primeira infância em que a direcção a tomar é a aquisição de competências necessárias para poder, como costumo referir, "cortar o cordão umbilical" com os pais.


A adolescência é o momento em que o indivíduo deve demarcar-se pela sua independência e autonomia. Quando isso não acontece no tempo devido, ou seja, quando se verifica uma adolescência marcada por uma grande dependência da figuras parentais onde não existe uma fractura para uma auto-suficiência psicológica, observamos que, na idade adulta, essas pessoas vivem como se andassem num mundo encantado, onde tudo gira em volta de uma fantasia infantil. São essas pessoas que fazem rupturas maiores, porque tudo aquilo que lhes deveria ter acontecido ao longo da existência não aconteceu. Não deram espaço a elas próprias. Depois acontecem aquelas coisas fantásticas,  pessoas adultas que experimentam mil e uma relações sem qualquer base sólida, como se em busca do príncipe encantado se encontrassem. Verificam-se, assim, adultos mergulhados em amores platónicos por pessoas com quem pessoalmente nunca entraram em contacto (lembram-se das paixões pelos grandes artistas na adolescência? É mais ou menos o mesmo mecanismo). Ou adultos que estávamos habituados a considerar como "certinhos" e fieis ao seu modo de vida saudável, a manifestarem as famosas «crises de meia idade», seja em que espectro for. Isso acontece porque as pessoas fora, de facto, pseudoadultos. A adolescência serve para aprendermos a ser adultos.

São necessária competências psicológicas durante este percurso turbulento a que se chama adolescência. Actualmente, e face a toda esta situação económica, a dependência dos pais no plano financeiro, é algo que é recorrente e cada vez numa idade mais prolongada do tempo. Cenário preocupante é quando verificamos a dependência por completo das figuras parentais, onde a autonomia interna do individuo se encontra comprometida (onde os pais é que impõem as suas opiniões e o sujeito, passivamente, limita-se a recebê-las), aí estamos a um passo de criar muitas "Alices no país das maravilhas"... até o despertador tocar. 

Um adulto (saudável) é aquele que é capaz da intimidade amorosa. E por intimidade não é dizer, vezes sem conta, "amo-te" pelas inúmeras redes sociais com que somos confrontados neste século. Intimidade significa a capacidade de abrirmo-nos ao outro e construirmos uma relação em que, para alem do corpo, se cresce numa relação intima.

Como é que isto pode ser integrado nos Contos de Fada? Este tipo de histórias infantis retratam, habitualmente, todas estas dualidades, estas viragens de sentimentos e comportamentos dos adolescentes. 

Contrariamente ao que foi abordado, por exemplo, na história do Capuchinho Vermelho, a respeito do Princípio do Prazer vs Princípio da Realidade,  no caso da Bela Adormecida esta abarca um período muito sensível no desenvolvimento: a pré-adolescência, a dualidade entre Ser Adulto e Permanecer Criança e mais especificamente para o caso das raparigas, o período que antecede à primeira menstruação...

Continua....