terça-feira, 15 de março de 2011

Do Sono aos Sonhos: Experiências (Para) Normais

Usualmente questionam-me com algumas dúvidas a respeito do mecanismo do sono: «dormir 4h por dia faz mal?»,  «Não me lembro dos sonhos, isso quer dizer alguma coisa?», «Às vezes acordo com a sensação de estar a ser esmagado contra a cama, é assustador...», «É normal sonhar e saber que se está a sonhar?».

Pegando nalgumas dessas dúvidas, decidi dar lugar ao mundo dos sonhos neste post, tentando explicar como funciona o mecanismo normativo do sono e, posteriormente, esclarecer algumas destas dúvidas.


Entendendo o Mecanismo do Sono

O período do sono é dividido, essencialmente, em 4 fases ou etapas, como se pode verificar na figura que se segue. 


Após nos deitarmos e fecharmos os olhos, preparando-mo-nos para dormir, somos invadidos por ondas alfa que nos preparam para o período de sono. Quando adormecemos, entramos, então, num período de Fase 1 do sono que é caracterizada por apresentar sinais de alta frequência e baixa voltagem semelhante, porém mais lento, do que o estado de vigília (acordado). 

À medida que vamos avançando da Fase 1 para as Fases 2,3 e 4, verifica-se um aumento de voltagem e uma baixa frequência cerebral. Assim, a Fase 2 apresenta uma amplitude um pouco maior e uma frequência menor que a Fase 1. Com a entrada na Fase 3 verifica-se a presença ocasional de ondas delta (as maiores e mais lentas), sendo que a Fase 4 é definida apenas por estas mesmas ondas (entramos no sono profundo). 

Quando antigimos a Fase 4 do sono, permanecemos por um tempo nessa condição e voltamos, em seguida, para o sono da Fase 1. Todavia, esta Fase 1 não é igual à verificada pela primeira vez. A partir do segundo ciclo, a entrada nesta fase é acompanhado por movimentos rápidos dos olhos (o chamado sono REM) e por uma perda do tónus muscular do corpo (aquela visão por vezes cómica que vemos na pessoa que está ao nosso lado a dormir e com espasmos). Cada ciclo do sono (de uma Fase 1 a Fase 4) dura, sensivelmente, 90 minutos, sendo que uma grande porção deste tempo é passado na Fase 1 (como se pode ver no gráfico)

Sono e Sonhos

Antes de mais, sonhamos em todas as fases do sono. Contudo, lembramo-nos com mais detalhe dos sonhos associados à fase REM (fase 1). Ou seja, enquanto os sonhos nas fases Não-REM (2,3,4) giram muito em torno de experiências indíviduais («sonhei que caí»), nos sonhos REM somos capazes de contar uma história mais completa («sonhei que estava a passear, encontrei um amigo e ficámos à conversa»).


Curiosidades sobre o Sono e os Sonhos


- Estímulos externos podem ser incorporados nos sonhos (por exemplo, ao adormecermos numa noite tempestuosa, podemos sonhar com explosões).
-  Algumas pessoas afirmam que nunca sonham ou raramente sonham. Contudo, apresentam um sono REM à semelhança das pessoas que dizem que sonham muito. Se forem acordados na Fase REM, conseguem relatar os sonhos.
-  Erecções penianas não estão relacionadas com sonhos de conteúdo sexual, uma vez que bebés apresentam o mesmo tipo de erecções nocturnas. Existem duas hipóteses aceites para este fenómeno: circulação sanguínea por parte do corpo para manter o órgão irrigado ou acumulação de urina na bexiga, provocando um estímulo nervoso reflexo que favorece a erecção (esta última é a mais aceite).
-  Sonambulismo e sonhos: a maioria das pessoas acredita que o sonambulismo ocorre enquanto sonhamos, o que não corresponde à realidade. Esta condição é vísivel com mais frequência na última fase do sono, a Fase 4.
-  Se não sabem porque é que nos custa tanto levantar de manhã, eis a resposta: Cortisol, a anestesia humana. Actua no nosso corpo a partir das 7h da manhã e provoca em nós uma sensação de relaxamento muscular. Daí que ao acordarmos nos apeteça tudo, menos levantar.
- Porque é que dormimos?  Existem duas teorias explicativas deste nosso comportamento:
A) Teorias da Recuperação do Sono: estar acordado perturba a estabilidade fisiológica interna do corpo. O sono apresenta, assim, uma função de recuperação e de recarga das energias.
B) Teorias Circadianas do Sono: tem uma base evolucionista, ao defender que os humanos são programados para dormir à noite independentemente do que nos acontecer durante o dia. Segundo estas teorias, evoluímos para dormir porque o sono protege-nos de acidentes e de predadores nocturnos.

Análise Comparada do Sono

Quando comparadas as horas de sono com outros mamíferos, surge uma questão importante no que nos toca a nós, humanos: Será mesmo necessário dormir as 8h? Uma investigação com diversos animais verificou a seguinte distribuição de horas de sono por dia: Preguiça Gigante - 20h;  Gato - 14h; Macaco - 9h;  Cavalo - 2h. Foram encontrados com muitos mais animais, mas tentei ir aos extremos para depreender dois aspectos essenciais: primeiro o sono não é uma função superior exclusiva do ser humano, segundo não parece existir um número de horas médio para os mamíferos. Será, então, necessário dormir as 8h recomendadas?

Para isso, vamos recordar o caso famoso de Leonardo Da Vinci. O pintor italiano adoptou um sono polifásico que consistia na seguinte redistribuição: dormir 15 minutos em cada 4 horas, limitando, assim, o seu tempo de sono a 1,5h por dia. Em diversas experiências com humanos que tentaram adoptar este sistema de sono polifásico, os resultados foram surpreendentes e consistentes:
a) Antes de tudo, é necessário um longo periodo de adaptação a este ciclo, de cerca de 2 a 3 semanas.
b) Os individuos sujeitos à experiência mostraram-se satisfeitos e não evidenciaram danos em testes de desempenho.
c) Inicialmente, estes invidíviduos só apresentavam sono de ondas lentas, contudo, com o passar do tempo retomaram as proporções relativais usuais de sono REM e sono de ondas lentas.

Uma das conclusões deste e outros estudos similares foi que a privaçao de sono em humanos é que indivíduos impedidos de dormir passam a fazê-lo de forma mais eficiente no horário estipulado. Assim, em vez de demoraram mais tempo a entrarem no sono profundo ao dormirem 8h, com as 4 ou 5h diárias, entram mais facilmente nessa fase. Contudo, este sono, como foi referido, exige hábito.


O Sono e o (Para)normal

Diversas são as histórias que vulgarmente somos confrontados, ainda hoje, sobre experiências fora do corpo, ou a sensação de estarmos a ser esmagados por espíritos durante a noite. Para acabar este post em beleza, vou destroçar os corações dos mais crentes...

Os Espíritos: Paralisia do Sono é o nome do fenómeno que muitos retratam quando acordam, a meio do sono, enquanto o bloqueio do impulso motor ainda está activo. Estando o bloqueio motor activo, a pessoa não se consegue mover e experiencia uma sensação assustadora de estar a ser empurrada para baixo, como se «espíritos estivessem em cima dela».

A Alma Fora do Corpo: Esta sensação de termos a alma a sair do corpo, ocorre pela situação inversa à apresentada em cima. Ou seja, experiênciamos esta sensação quando estamos acordados e os nervos motores começam a ser bloqueados, preparando-nos para o período de sono. Assim, temos a sensação de um formigueiro e de uma leve levitação. É tudo cérebro meus caros.

por fim... 

Os Sonhos lúcidos ocorrem quando os lobos frontais (responsáveis pela nossa consciência, mediação de impulsos sociais, funções superiores, racionalidade) acordam durante o sono mas o bloqueio de sinais de entrada e de saída permanecem. Como os lobos frontais estão activos, conseguimos deduzir que, realmente, estamos a sonhar. 

3 comentários:

  1. Ola Claudio gostei muito do texto! nunca tinha lido nada sobre o sono e achei muito interessante.
    mas sera que voce saberia me responder o que acontece comigo quando estou começando a dormir, acho que na 1 fase onde o sono esta ainda "leve" algumas vezes eu tenho um "tremiliques" na perna como se eu tivesse caindo de uma ponte... aí eu acordo assustada com o coração acelerado.É muito estranho, o que sera isso??

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  2. Cara Maria Cristina,

    Não sei se percebi bem essa sua dúvida. Essa sensação que fala de estar a cair de uma ponte, acontece, justamente e como refere, no período em que nos preparamos para dormir.

    Os nervos motores vão-se desligando (para não andarmos pela casa enquanto dormimos) a pouco e pouco, dando-nos a sensação ou de levitar ou de vertigens.

    Em relação aos "tremeliques" são apenas espasmos musculares que ocorrem habitualmente nas pernas ou nos braços quando os referidos nervos motores se vão desligando.
    Não é, de todo, motivo de alarme, acontece à maioria das pessoas. Experienciamos esse tipo de sensações apenas porque estamos acordados quando o impulso motor ainda se está a desligar.

    A situação inversa é a paralisia do sono, ou seja quando acordamos e a parte motora continua bloqueada, então temos a sensação de estarmos presos e de não nos conseguirmos mexer.

    Espero ter conseguido esclarecer a sua questão.

    Cumprimentos,
    Cláudio

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  3. Olá Claudio, achei muito interessante esse seu texto sobre o sono..
    Cheguei à ele pois estava procurando uma expliacação para o que aconteceu ontem pela manhã..
    Acordei umas 5 horas da manhã, com frio, então fui ao banheiro, peguei mais uma coberta e voltei a cama para dormir até as 7h45, que é o horário que normalmente levanto..
    Então tive um "sonho" (eu acho)..
    eu estava deitada de lado, e tive a sensação de ter algo me empurrando o ombro e quando percebi isso eu fiz muita força ao contrário do "empurrão" pois tinha a sensação de que se eu deixasse me empurrar eu ia cair..
    e não conseguia me mexer, fiquei bem assustada e tentava ver se tinha algo mas não conseguia ou não tinha nada ali. Aí fiz esforço para chamar pela minha mãe mas também nao conseguia, nao tinha voz, ou tinha algo na minha garganta.. até que eu consegui me mecher e gritei para minha mãe e sai correndo.. isso era 7h da manha quando olhei no relógio..
    mas fiquei bem assustada, minha mãe disse que nao era nada, que eu estava sonhando, mas sei lá..

    E esta ultima noite eu nao consegui dormir, estava com muito sono, como os olhos inchados, mas eu fechava os olhos e não conseguia dormir.. acho que realmente consegui dormir já era umas 4h30..
    oque será que pode ser isso?

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