segunda-feira, 22 de novembro de 2010

O Menino de Ouro - Ensaios sobre a Submissão


Começaremos este post por caracterizar, sintéticamente, Sua Majestade - O Bebé.
Um recém-nascido é, basicamente, uma massa de necessidades (sejam elas do foro fisiológico ou emocionais), ficando dependente, inteiramente, das pessoas que o rodeiam. Ao mundo externo fica, assim, incutida a responsabilidade de atender às necessidades do bebé, não estando este equipado para perceber as dos demais (a coisa mais importante que pode oferecer em troca é a satisfação de ser visto, reagindo aos cuidados que lhe são dados). 

Contudo, aquando à chegada da fase adulta, é expectável que uma porção substancial da sua vida se constitua em colocar em segundo plano as suas próprias necessidades e assumir, então, responsabilidades pelas necessidades dos outros. Para que esta transição ocorra de forma saudável e adaptativa, são requeridos cerca de dois passos: 

1. Em primeiro lugar, o bebé deve receber o suficiente dos outros quando apela à satisfação das suas necessidades básicas. 
2. Posteriormente, é importante que a criança tenha consciência que nem todas as suas exigências podem ser atendidas imediatamente, se é que alguma vez o podem, e que os demais apresentam tantas necessidades tanto quanto ele.

Se o segundo passo é colocado em acção de modo demasiado lento ou ineficaz, a criança tende a personalizar-se num ser cheio de exigências, egoísta e incapaz de tolerar frustrações. Por outro lado, se o primeiro requisito não é preenchido e / ou se o segundo e levado a cabo demasiado rápido (que é o aspecto de maior relevância neste post), o resultado será um individuo afectivamente carente, cheio de necessidades não satisfeitas, muitas vezes intolerante ante exigências. 

Para colmatar tal carência de necessidades, diversas são as vezes em que se assiste a um perfil de submissão por parte destes indivíduos, sendo descritos pelos próximos como uma “pessoa bondosa”, “o filho que todos gostariam de ter” (não esquecendo, contudo, que a sua intolerância ante exigências é descrita invariavelmente como “muitas vezes tem mau feitio mas não deixa de ter um bom coração”). 

A elevação de tais qualidades morais destas pessoas pelo objecto para com o mundo com que se relalaciona, tem um efeito de feedback positivo, intensificando as formações reactivas (ver post – Mecanismos de Defesa) ao sadismo e agressividade (tentando inibir o referido “mau feitio”): piedade, comoção perante o sofrimento alheio, espírito de sacrifício, gratidão excessiva, amor ao trabalho e pelo trabalho, etc.

O indivíduo submisso apresenta-se, assim, ao mundo como uma pessoa tímida, envergonhada em matéria de afecto, faminta de amor, uma vez que a inibição não extingue o desejo, apenas o encobre. Como refere Coimbra de Matos: “sempre na expectativa da recusa amorosa do objecto actual - no qual antevê uma resposta idêntica à da imago infantil – retrai-se fobicamente. Insatisfeito, não pára de procurar amor, mesmo que para o obter tenha de se submeter masoquisticamente – como o fez (porque teve de o fazer) na infância (ainda que para receber tão somente restos, migalhas, esmolas.”

Sempre aguardando o dia em que a pessoa amada o abandone e recuse o seu amor, o sujeito procura actos de sedução, conquistando o interesse através da sua exibição, ou seja, sente a necessidade de se mostrar melhor do que aquilo que realmente é (self real), ou do que se julga, evidenciando, desta forma, a uma patologia do ideal do eu (self ideal): ser perfeito, completo, o mais inteligente, o mais belo.  

Que implicações podemos constatar nestes indivíduos no palco das suas relações sociais? A ânsia de afecto e o medo da recusa e/ou abandono por parte do outro, leva a que estas pessoas sejam presas fáceis de alguém que, pela sua abertura de contacto, o cativa, e encanta, mas que o tem completamente nas mãos. Não são tão poucas as vezes em que se observa indivíduos com esta estrutura de personalidade a submeterem-se às ordens do seu objecto de amor, quando este lhe mata a fome de afecto que tanto procura.

 Concluindo, saciada esta fome narcísica, o outro pode então maltratá-lo, traí-lo ou explorá-lo, que o masoquista não o deixará de amar e de se lhe submeter.

Termino este post lançando o desafio de observar atentamente as relações que nos rodeiam e questionando: 

Quão estranho é este quotidiano? 


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